Terceira idade e saúde mental: a importância da escuta e do propósito
- Gustavo Gabaldi
- há 5 horas
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Envelhecer é uma parte natural da vida — e, apesar de inevitável, costuma vir acompanhada de mudanças que vão muito além do corpo. Aposentadoria, filhos adultos, rotina mais calma, ausência de pessoas queridas... tudo isso pode mexer profundamente com o emocional.

Mas, diferente do que muita gente pensa, a terceira idade não precisa ser sinônimo de solidão, tristeza ou inatividade. Essa fase pode, sim, ser uma etapa de descobertas, aprendizado e reconexão com o que realmente importa. E dois fatores são fundamentais para isso: a escuta e o propósito.
O silêncio que pesa
Muitos idosos enfrentam um tipo de solidão que não vem da ausência física de pessoas, mas da falta de escuta verdadeira.Quantas vezes você já viu um idoso tentando contar uma história e sendo interrompido com um “ah, já sei!” ou um “depois você me conta”?
Com o passar do tempo, a sensação de “não ser mais ouvido” se acumula — e isso impacta diretamente a saúde mental.Essa falta de espaço para se expressar pode gerar sentimentos de invisibilidade, tristeza, desânimo e até inutilidade.
Além disso, a perda de papéis sociais (como o de trabalhador, cuidador ou referência familiar) pode fazer com que o idoso sinta que perdeu parte da própria identidade.É aí que surgem pensamentos como “não sirvo mais para nada” ou “ninguém se importa comigo”.
E quando a mente começa a acreditar nessas ideias, o corpo responde: o sono muda, o apetite diminui, a vitalidade se esvai. É o ciclo da solidão se fechando.
A importância da escuta verdadeira
Escutar alguém é um gesto simples, mas poderoso.E no caso da terceira idade, é um dos atos mais humanos e curativos que existem.
A escuta não é apenas “deixar o outro falar”. É estar presente, com interesse genuíno, sem pressa e sem julgamento.Quando um idoso se sente ouvido, algo muda internamente: ele recupera autoestima, sente-se valorizado e percebe que sua voz ainda importa.
Essas conversas, muitas vezes, funcionam como pequenas terapias informais — resgatam lembranças boas, fortalecem vínculos e aliviam angústias guardadas.Família, amigos e cuidadores têm um papel essencial nesse ponto: dar espaço à fala e ao sentimento é uma forma de cuidado tão importante quanto qualquer remédio.
E o psicólogo, nesse contexto, pode ajudar muito. A terapia na terceira idade é um espaço de acolhimento, onde a pessoa pode falar livremente sobre suas dores, perdas e também sobre seus sonhos — porque sim, ainda há sonhos.
O poder do propósito
Depois de décadas de rotina intensa, trabalho, responsabilidades e cuidados com os outros, muitas pessoas chegam à terceira idade e se perguntam:“E agora? Qual o meu papel?”
Essa pergunta é central.Ter um propósito — algo que dá sentido e motivação ao dia — é um dos maiores protetores da saúde mental.
E propósito não é necessariamente algo grandioso. Pode estar em gestos simples:
cuidar de um jardim ou de um bichinho de estimação;
participar de grupos de convivência;
dedicar tempo a um hobby antigo;
ajudar um vizinho;
contar histórias aos netos;
aprender algo novo (um idioma, uma arte, uma receita).
O importante é sentir-se vivo, útil e conectado.O cérebro humano precisa de desafios, vínculos e curiosidade para se manter saudável — e isso não muda com a idade.
Quando a pessoa encontra uma razão para se levantar de manhã, o humor melhora, a disposição aumenta e até o corpo responde melhor.
Envelhecer não é parar — é transformar
O envelhecimento não precisa ser visto como uma “descida”. Ele pode ser uma nova curva, com outro ritmo, outros aprendizados e um olhar mais leve sobre a vida.Muitos idosos redescobrem paixões antigas, constroem novas amizades e se permitem viver experiências que antes não cabiam na correria da juventude.
Mas para isso acontecer, é fundamental olhar para essa fase com respeito e abertura, tanto individualmente quanto socialmente.A sociedade ainda precisa aprender a valorizar o envelhecer — não como um “problema”, mas como um capítulo riquíssimo da história humana.
O papel da família e da comunidade
A família tem um papel essencial nesse processo.Estar presente, ouvir, incluir o idoso nas conversas e decisões, respeitar suas opiniões — tudo isso reforça o sentimento de pertencimento.
Pequenos gestos fazem uma grande diferença:
pedir conselhos,
ouvir uma história até o fim,
convidar para participar de algo,
reconhecer o quanto aquela pessoa contribuiu (e ainda contribui).
Além disso, comunidades e grupos de convivência são fundamentais. Espaços onde idosos podem se reunir, conversar, praticar atividades, dançar, rir, aprender e ensinar são verdadeiros antídotos contra o isolamento.
A terceira idade não é o fim de uma estrada, mas uma nova paisagem — mais tranquila, mais reflexiva, e, se houver escuta e propósito, também mais significativa.
Cuidar da saúde mental dos idosos é mais do que oferecer suporte emocional: é reconhecer a riqueza da experiência, o valor da escuta e o poder do sentido de viver.
Porque no fundo, o que todo ser humano precisa — em qualquer idade — é saber que a sua vida ainda tem importância.
E quando há propósito e alguém disposto a ouvir, a mente floresce, mesmo quando o corpo já caminha com mais calma.



